Quando pensamos em menopausa, lembramo-nos sobretudo dos sintomas e desconfortos, dos afrontamentos, das alterações do sono, das oscilações de humor. Mas raramente a saúde dos ossos é uma preocupação.
Contudo, a osteoporose é uma das consequências silenciosas da menopausa. É chamada de “doença silenciosa” porque não causa sintomas, e muitas mulheres só descobrem que a têm depois de sofrerem uma fratura óssea.
Apesar de pouco falada, a osteoporose é uma doença comum, subdiagnosticada e subtratada. É uma condição frequente nas mulheres após a menopausa e, em Portugal, estima-se que afete cerca de 17% das mulheres, número que aumenta significativamente com a idade.
Pensem nas vossas amigas, nas vossas mães, nas vossas tias, em vocês… é muito provável que algumas delas tenham osteoporose sem saber.
Para nos ajudar a compreender melhor este tema, convidei o Dr. Luís Miranda, médico reumatologista com vasta experiência no tratamento da osteoporose, para responder a um conjunto de perguntas essenciais e explicar-nos como podemos cuidar da saúde dos nossos ossos, não só na menopausa, mas ao longo de toda a vida.
Para começar, o que é a osteoporose?
Dr. Luís Miranda: Existem várias formas de definir a osteoporose, mas podemos dizer que é uma doença do osso em que a sua quantidade e qualidade estão diminuídas. O osso tem pior qualidade e está menos mineralizado, com um aumento da possibilidade de fratura. Ou seja, é um osso mais fraco e, quando sujeito a um impacto baixo, pode partir mais facilmente do que o de outras pessoas que tenham um osso normal.
Em termos de definição formal, podemos afirmar que a osteoporose pode ser definida como “uma doença esquelética sistémica caracterizada por baixa massa óssea e deterioração da microarquitetura do tecido ósseo, com consequente aumento da fragilidade óssea”.
Por que é que as mulheres têm maior probabilidade de desenvolver osteoporose após a menopausa e qual é o papel dos estrogénios na doença?
Dr. Luís Miranda: Sabemos que, nos três anos seguintes à menopausa, a perda anual de massa óssea pode atingir cerca de 2 a 2,5%, o que está diretamente relacionado com as alterações hormonais que ocorrem neste período.
A diminuição dos níveis de estradiol e o aumento da FSH estão intimamente ligados à perda de massa óssea e, por isso, nos anos que se seguem à menopausa, observa-se uma redução significativa na quantidade e na qualidade do osso. Nas mulheres mais suscetíveis, quer por fatores genéticos, quer pela presença de fatores de risco associados, esta perda pode culminar no desenvolvimento de osteoporose.
Epidemiologicamente, sabemos também que as mulheres são mais afetadas pela osteoporose do que os homens.
Quais são as consequências da osteoporose? Por que é que me devo preocupar com este tema?
Dr. Luís Miranda: O mais importante, em termos de impacto da osteoporose, são as fraturas. As fraturas por fragilidade afetam mais frequentemente a anca, a coluna e o antebraço distal. As consequências dessas fraturas são evidentes em termos de mortalidade, morbilidade e custo económico.
Estimativas mundiais sugerem que 1 em cada 3 mulheres e 1 em cada 5 homens com mais de 50 anos sofrerão uma fratura osteoporótica ao longo da vida. A osteoporose afeta desproporcionalmente a população idosa, que pode já apresentar fragilidade e capacidade funcional reduzida, o que torna o impacto destas fraturas particularmente devastador.
Existe um aumento da mortalidade associada, nomeadamente nas fraturas da anca, mas é sobretudo a incapacidade temporária ou definitiva associada às fraturas osteoporóticas que determina um enorme impacto pessoal, familiar e social. Cerca de 50% dos doentes que sofrem uma fratura da anca relacionada com osteoporose perdem a capacidade de viver de forma autónoma e, no ano imediatamente após a fratura, até 20% morrem.
Também os custos sociais associados são muito elevados. Um estudo da International Osteoporosis Foundation (2019) estimou que Portugal gastou cerca de 1003 milhões de euros em aproximadamente 70.000 fraturas osteoporóticas nesse ano, representando 5,6% do total de gastos em saúde.

Tenho a sensação de que ainda existe uma certa aceitação social em relação à fragilidade das mulheres à medida que envelhecem, e a osteoporose não foge a essa regra. Concorda com esta visão?
Dr. Luís Miranda: Tal como acontece com a dor ou com a incapacidade, há uma aceitação desta como sendo inevitável e como o reverso da medalha que temos de pagar pelo envelhecimento. A fragilidade associada ao envelhecimento está profundamente enraizada na sociedade portuguesa e tem de ser combatida diariamente, sobretudo pelos médicos, mas diria que por todos em geral.
Envelhecer bem não é apenas um privilégio, é uma estratégia que cada indivíduo deve adotar para lutar contra alguns dos determinantes da idade que são modificáveis — e são muitos aqueles que podemos melhorar ou diminuir o seu impacto até aos últimos dias de vida.
O músculo e o exercício são a base de qualquer estratégia, à qual se deve associar uma alimentação equilibrada e o combate ao excesso de peso. Se juntarmos o tabaco, temos a base para conseguir uma reserva fisiológica suficientemente boa para enfrentar os muitos desafios do envelhecimento. E a osteoporose, enquanto doença e fator de risco de incapacidade, está profundamente ligada ao envelhecimento.
A osteoporose afeta todas as mulheres da mesma forma? Quem são as mulheres que estão em maior risco de desenvolver osteoporose?
Dr. Luís Miranda: As mulheres mais afetadas pela osteoporose são aquelas que apresentam um maior número de fatores de risco. A componente genética tem um papel muito importante, nomeadamente a existência de osteoporose e/ou fraturas de baixo impacto em progenitores ou avós. O tabagismo, o consumo excessivo de café, o uso prolongado de determinados medicamentos e a presença de algumas doenças, como a artrite reumatoide ou a anorexia nervosa, estão entre os fatores que aumentam o risco de desenvolver osteoporose.
Como é que sei se tenho osteoporose? Quais são os exames que preciso de fazer e quando?
Dr. Luís Miranda: A pior forma de se obter o diagnóstico é na presença de uma fratura sem impacto ou de baixo impacto (por exemplo, cair da posição de pé). Contudo, existem exames e outras formas de identificar o risco de fratura e de diagnosticar uma osteoporose.
A densitometria óssea (DEXA) é um exame utilizado há muito tempo para obter uma avaliação da densidade óssea. É possível obter o diagnóstico densitométrico de osteoporose através da DEXA.
Outra forma de avaliar o risco de fratura é através de um algoritmo matemático — o FRAX— que, mediante a resposta a algumas perguntas, pode dar-nos o risco fraturário e, com isso, ajudar o médico assistente a decidir se deve ou não medicar.
No que à saúde diz respeito é melhor prevenir do que tratar, e a osteoporose não será exceção. Como posso prevenir a osteoporose e cuidar da saúde dos meus ossos?


Dr. Luís Miranda: Podemos afirmar que a osteoporose, em termos de prevenção, pode ser considerada uma “doença pediátrica”. Ou seja, deve investir-se na saúde óssea desde a infância, através de uma boa ingestão de alimentos ricos em cálcio e da promoção, desde cedo, da prática regular de exercício físico.
Esses hábitos determinam o pico de massa óssea, ou seja, o momento da vida em que a mulher atinge a maior quantidade de osso. Como se pode perceber, se esse pico for baixo, será muito mais fácil vir a ter osteoporose.
Contudo, é a consistência ao longo da vida e a forma como evitamos fatores de risco (como o tabagismo, por exemplo), que irão melhorar as perspetivas futuras em relação à osteoporose.
Existem suplementos ou vitaminas específicas que podem ajudar a manter os ossos saudáveis?

Dr. Luís Miranda: Uma dieta variada, que permita obter entre 1 e 1,5 g de cálcio (dependendo da idade) e cerca de 800 UI de vitamina D por dia, poderá ser suficiente. Contudo, caso esses valores não sejam alcançados, devemos suplementar.
Outros suplementos podem ser interessantes, mas não para a osteoporose. Tal como o nome indica, os suplementos devem ser utilizados apenas quando a alimentação e a exposição solar são inadequadas ou contraindicadas.
Que conselhos daria a uma mulher entre os 40 e os 50 anos, ainda na perimenopausa, para otimizar a saúde óssea? Ou será que deveria ter começado a cuidar dos seus ossos mais cedo?
Dr. Luís Miranda: Nunca é tarde para ter um plano de vida até ao final da vida, e é claro que, tanto para a osteoporose como para muitas outras doenças reumáticas e não reumáticas, ir construindo uma reserva fisiológica o mais robusta possível pode fazer a diferença entre uma vida plena ou um envelhecimento sem qualidade.
Quando falamos de reserva fisiológica, referimo-nos à capacidade muscular e cardiovascular que permite a qualquer pessoa, quando confrontada com uma situação de grande stress fisiológico, recuperar e voltar a uma vida o mais próxima do normal possível.
Dando um exemplo concreto da osteoporose, a fratura da anca tem um impacto tremendo na vida de qualquer mulher e, no contexto da osteoporose ou do idoso, aumenta muito significativamente a mortalidade. Tal acontece sobretudo nas pessoas que têm pouco músculo e reduzida capacidade cardíaca e pulmonar, o que as leva a permanecer incapacitadas ou mesmo acamadas.
Num idoso que pratique regularmente exercício e que tenha uma boa capacidade física, essa incapacidade pode existir, mas existe igualmente a capacidade de voltar a não estar dependente e de rapidamente voltar à capacidade física pré fratura.
Não sendo muito diferente entre a pré e a pós-menopausa, é evidente que a possibilidade de criar músculo e de realizar exercício com carga é maior entre os 40 e os 50 anos e essa deve ser a estratégia a adotar na perimenopausa para promover um melhor envelhecimento de forma global.
O músculo responde sempre, mas com o aumento da idade é necessário trabalhá-lo de outra forma e, muitas vezes, com maior frequência. Não devemos esquecer que a criação de músculo está intimamente ligada ao consumo de proteína na dieta e que, nos hábitos alimentares portugueses, a ingestão de proteína é escassa e, muitas vezes, de baixa qualidade.
E se já tiver osteoporose, posso fazer exercício físico? Que tipo de exercício é recomendado?

Dr. Luís Miranda: O exercício é a base do tratamento da osteoporose, ao qual se deve associar um bom aporte de cálcio e de vitamina D, preferencialmente através da alimentação, embora por vezes seja necessária suplementação medicamentosa.
O exercício deve ser sempre adaptado a cada pessoa, tendo em conta as suas características, preferências e limitações. Não deve ser de elevado impacto, mas, ao contrário de outras situações, devem evitar-se atividades de baixo impacto (como natação ou hidroginástica).
É importante incluir algum grau de impacto e trabalhar a prevenção de quedas, pelo que modalidades como pilates, ioga ou exercícios com componente cardiovascular são recomendadas, sempre de acordo com as possibilidades e a capacidade de progressão de cada mulher.
Todas as mulheres precisam de fazer tratamento para a osteoporose? Se tiver osteoporose ainda há alguma coisa a fazer?
Dr. Luís Miranda: Nem todas as mulheres devem fazer medicação para a osteoporose — isso depende da gravidade da doença, nomeadamente da presença ou não de fraturas osteoporóticas e do risco avaliado pelo médico assistente.
O objetivo do tratamento da osteoporose é evitar uma fratura inicial ou uma nova fratura osteoporótica. As estratégias terapêuticas, para além do exercício e da ingestão ou suplementação de cálcio e vitamina D, passam por dois tipos de medicação: os antirreabsortivos e os osteoformadores.
Entre os antirreabsortivos incluem-se os bifosfonatos, como o ácido alendrónico, ibandrónico, zoledrónico ou risedronato de sódio, e também o denosumab, um anticorpo monoclonal. Já entre os osteoformadores temos atualmente a teriparatida e, mais recentemente, a abaloparatida.
De forma muito simples, podemos diferenciá-los da seguinte forma: os antirreabsortivos atuam inibindo as células que reabsorvem o osso, o que faz com que a atividade das células que o constroem se torne predominante. Por outro lado, os osteoformadores estimulam diretamente as células formadoras de osso. Em ambos os casos, verifica-se uma melhoria na quantidade e qualidade óssea e, sobretudo, uma redução do risco de fratura.
Qualquer estratégia terapêutica deve ser definida pelo médico assistente e, nos casos mais graves ou complexos, a doente deve ser referenciada para Reumatologia.
Para as mulheres que desejam discutir o seu caso concreto, a que especialidades médicas devem recorrer?
Dr. Luís Miranda: Pela sua prevalência e, muitas vezes, pela simplicidade, a maioria dos casos de osteoporose pode ser acompanhada pelo médico de família. Contudo, os casos mais complexos ou graves devem ser orientados e seguidos pela Reumatologia, frequentemente com o apoio de outras especialidades, como Ortopedia ou Neurocirurgia, entre outras.
Para concluir, quais seriam as três mensagens-chave que devemos reter quando falamos de osteoporose e envelhecimento?
- Prevenir é fundamental e o exercício e a alimentação são a base dessa prevenção.
- Não aceitar que não há nada a fazer e que envelhecer é aceitar a osteoporose como inevitável.
- O osso é apenas um indicador do envelhecimento, e envelhecer é uma inevitabilidade, mas é sobretudo um desafio e um projeto de vida que ou se opta por enfrentar, ou nos resignamos a um caminho de incapacidade e limitação profunda da qualidade de vida até ela terminar.
Depois destas três conclusões do Dr. Luís Miranda, nem seria preciso acrescentar muito mais. Mas aproveito para deixar um alerta: conversem sobre a saúde dos vossos ossos na próxima consulta com o vosso médico assistente.
Para ajudar, deixo três perguntas simples que podem servir de ponto de partida para a conversa:
- Quais são os meus fatores de risco para osteoporose, incluindo doenças ou medicamentos que possam causar perda óssea?
- Com base nos meus fatores de risco individuais, qual é o meu risco de fraturas a longo prazo?
- Tenho indicação para fazer uma densitometria óssea para medir a minha densidade mineral óssea?
Quanto mais cedo soubermos, mais cedo podemos agir.
Até breve!
Rita
Fotografia: Márcia Soares